A REESCRITA EM PRODUÇÕES ACADÊMICAS: UM INDICADOR DE REFINAMENTO TEXTUAL EM CURSOS DE GRADUAÇÃO?

Autores

DOI:

https://doi.org/10.54221/rdtdppglinuesb.2023.v11i1.254

Palavras-chave:

Processo de Escrita. Reescrita. Letramento Acadêmico.

Resumo

O objetivo desse trabalho é investigar se a atividade de reescrita de textos causa interferências em termos de aperfeiçoamento e desenvolvimento da escrita de estudantes universitários iniciantes, tendo em vista que estão no processo de apreensão das práticas de produção textual da academia. Especificamente, buscamos identificar os (pré)conhecimentos de discentes universitários acerca do processo de escrita e das práticas acadêmicas de produção textual, observar o processo de escrita de textos ao comparar diferentes versões a fim de identificarmos a prática de reescrita e, por fim, analisar os possíveis efeitos dessa prática. Acreditamos que a escrita é um recurso essencial para a sociedade e seu domínio garante aos sujeitos a inserção e a permanência em diversos campos da atividade humana. Pesquisadores como Hayes e Flower (1980, 1981) e Prado (2019) apontam que ela acontece em meio a um processo que exige que o escrevente percorra diversas etapas, entre elas, a reescrita, que é a refacção do texto tendo em vista sua melhoria. Além disso, segundo Bakhtin (2016), a atividade humana está interligada ao uso da língua, o que acontece por meio dos gêneros discursivos gerados nos espaços de interação e de comunicação, que são campos de utilização da linguagem.  É o caso do campo acadêmico, espaço específico de produção científica que elabora gêneros discursivos mais especializados, os quais, justamente por essa característica, estão, em certa medida, distanciados dos indivíduos que não o integram. A fim de efetivarmos nossa investigação, produzimos diários de bordo a partir da observação de aulas de uma turma do primeiro semestre de um curso de Letras, em uma universidade pública do interior da Bahia. As aulas foram observadas durante a segunda unidade de uma disciplina que tinha por intuito o trabalho com a leitura, a interpretação e a escrita de textos acadêmicos. Nosso corpus é constituído pelos diários de bordo acima mencionados, pelos materiais didáticos utilizados em sala de aula, pelas respostas a um questionário aplicado à turma, por diferentes versões de textos escritos por quatro estudantes e, finalmente, pela transcrição de uma entrevista que realizamos ao final do processo metodológico. Além da perspectiva bakhtiniana da linguagem como instrumento de interação, tomamos como base teórica principal a ampliação do modelo cognitivo de escrita de Hayes e Flower (1980, 1981) realizada por Prado (2019); os estudos, principalmente, de Fabre (1986, 1991, 2000, 2002), de Fiad (2009, 2013) e de Menegassi (1998) a respeito da reescrita; as considerações de letramento por Soares (2004) e Lea e Street (1998), e de letramento acadêmico por Fisher (2008), Bezerra (2012) e Marinho (2010). Os nossos dados revelam que a tarefa de reescrita possibilita uma produção textual autônoma, interativa e dialógica, capaz de potencializar a prática de escrita do escrevente e de auxiliá-lo efetivamente em sua constituição como sujeito acadêmico.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Referências

ABAURRE, Maria Bernadete M. et al. Subjetividade, alteridade: reflexos, nas primeiras escritas, da alternância de lugares discursivos. Estudos linguísticos XXVII – Anais de Seminários do GEL. São Paulo: USP, p. 43-53, 1997.

ANTUNES, Irandé. Aula de Português: encontro e interação. São Paulo: Parábola, 2003.

ANTUNES, Irandé. Avaliação da produção textual no ensino médio. In: BUNZEN, Clécio; MENDONÇA, Márcia (org.); KLEIMAN, Angela B. et al. Português no ensino médio e formação do professor. São Paulo: Parábola Editorial, 2006, p. 163-180.

BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. Tradução de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2016.

BAKHTIN, Mikhail. Teoria do Romance I: a estilística. Organização, tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. 1ª ed. São Paulo: Editora 34, 2015.

BARTON, D.; HAMILTON, M. Literacy practices. In: BARTON, D. et al. (ed.). Situated literacies: reading and writing in context. London: Routledge, 2000. p. 7-15.

BEZZERA, Benedito Gomes. Letramentos acadêmicos na perspectiva dos gêneros textuais. Fórum Linguístico, v. 9, n. 4, out./dez. 2012.

BECKER, Anne. A review of writing model research based on cognitive Writing. In: HORNING, Alice; BECKER, Anne (ed.). Revision: history, theory, and practice. West Laffayette, Indiana: Parlor Press and The WAC Clearinghouse, 2006, p. 25-49

BOGDAN, R.; BIKLEN, S. K. Qualitative Research for Education. Boston, Allyn and Bacon, Inc. 1982.

CALIL, Eduardo; FELIPETO, Sonia Cristina. Rasuras e operações metalinguísticas: problematizações e avanços teóricos. Cadernos de Estudos Linguísticos, Campinas, SP, v. 39, p. 95–110, 2012. DOI: 10.20396/cel.v39i0.8636940. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cel/article/view/8636940.

DESLAURIERS, Jean-Pierre; KÉRISIT, Michèle. O delineamento de pesquisa qualitativa. In.: POUPART, J. et al. (org.). A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Tradução de Ana Cristina Nasser. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 127-153.

FABRE, Claudine. La linguistique génétique: une autre entrée dans la production d’écrits. Repères, Paris, n. 4, p. 49-58, 1991.

FABRE-COLS, Claudine. Contribution de Claudine Fabre-Cols. In: Pratiques: linguistique, littérature, didactique, n°105-106, 2000. p. 213-217; doi: https://doi.org/10.3406/prati.2000.2411. Disponível em: https://www.persee.fr/doc/prati_0338-2389_2000_num_105_1_2411.

FABRE-COLS, Claudine. Réécrire à l’école et au collège: de l’analyse de brouillons à l’écriture accompagnée. France: ESF Éditeur, 2002.

FIAD, R. S. Reescrita de textos: uma prática social e escolar. Organon, Porto Alegre, v.29, n.46, 2009. DOI: 10.22456/2238-8915.39740. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/organon/article/view/39740.

FIAD, Raquel Salek; MAYRINK-SABINSON, Maria Laura Trindade. A escrita como trabalho. In: MARTINS, M. H. (org.). Questões de linguagem. 6. ed. São Paulo: Contexto, 2001.

FIAD, Raquel Salek. Reescrita, dialogismo e etnografia. Linguagem em (Dis)curso, Tubarão - SC, v. 13, n. 3, p. 463-480, set./dez. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ld/a/gbJwWJwK9QYQDzdXKsNxfyz/?format=pdf&lang=pt.

FIAD, Raquel Salek. (RE)escrita e estilo. In: ABAURRE, Maria Bernadete M.; FIAD, Raquel Salek; MAYRINK-SABINSON, Maria Laura T. Cenas de aquisição da escrita: o sujeito e o trabalho com o texto. Campinas – SP: Mercado de Letras, 1997, p. 155-173.

FISCHER, Adriana. Letramento acadêmico: uma perspectiva portuguesa. Acta Scientiarum Language and Culture. Maringá – PR, v. 30, n. 2, 2008, p. 177-187. Disponível em: https://doi.org/10.4025/actascilangcult.v30i2.2334.

FLOWER, Linda; HAYES, John R. A cognitive process theory of writing. College Composition and Communication, v. 32, n. 4, p. 365-387, dez. 1981.opl

GEHRKE, N. A. Na leitura, a gênese da reconstrução de um texto. Porto Alegre: Letras de hoje, v. 28, n. 4, p. 115-154, 1993. Disponível em: https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/fale/article/view/16037.

GROULX, Lionel-Henri. Contribuição da pesquisa qualitativa à pesquisa social. In: POUPART, J. et al. (org.). A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Tradução de Ana Cristina Nasser. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 95-125.

GINZBURG, Carlo. Sinais: raízes de um paradigma indiciário. In: GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas, sinais. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. p. 143-179

HAYES, J. R. A new framework for understanding cognition and affect in writing. In: LEVY, C. M.; Ransdell, S. (ed.). The science of writing. Theories, methods, individual differences, and applications. Mahwah, New Jersey: Lawrence Erlbaum Associates, Publishers, 2000, p. 1-27.

HAYES, John. Modeling and remodeling writing. Written Communication, Thousand Oaks, v. 29, n. 3, p. 369-388, 2012.

HAYES, J. R. et al. Cognitive processes in revision. In: ROSENBERG, S. (org.). Advances in Applied Psycholinguistics: reading, writing, and language learning, v. 2. Cambridge: Cambridge University, 1987. p. 176-240

HAYES, John R.; FLOWER, Linda S. Identifying the Organization of Writing Processes. In: GREGG, Lee W.; STEINBERG, Erwin Ray. Cognitive Processes in Writing. Hillsdale, NJ: Lawrence Erlbaum Associates, 1980, p. 3-30

HIGOUNET, Charles. História concisa da escrita. São Paulo: Parábola, 2018.

JACCOUD, Mylène; MAYER, Robert. A observação direta e a pesquisa qualitativa. In: POUPART, J. et al. (org.). A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Tradução de Ana Cristina Nasser. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 254-294.

LEA, Mary R.; STREET, Brian V. Student writing in higher education: an academic literacies approach. Studies in higher education, v. 23, n. 2, jun. 1998.

LUDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

MANGABEIRA, Andréa Burgos de Azevedo; COSTA, Everton Vargas da; SIMÕES, Luciene Juliano. O bilhete orientador: um gênero discursivo em favor da avaliação de textos na aula de línguas. Cadernos do IL, Porto Alegre, n. 42, p. 293-307, jun. 2011.

MARINHO, Marildes. A escrita nas práticas de letramento acadêmico. Revista Brasileira de Linguística Aplicada, v. 10, n. 2, abr./jun. 2010.

MELO, Márcia Helena de. A apropriação de um gênero: um olhar para a gênese de texto no ensino médio. 2000. 174f. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada) – Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 2000.

MENEGASSI, Renilson José. Da revisão à reescrita: operações e níveis linguísticos na construção do texto. 1998. 291f. Tese (Doutorado em Letras) – Universidade Estadual Paulista, Assis, 1998.

MENEGASSI, R. J.; GASPAROTTO, D. M. Revisão textual-interativa: aspectos teórico-metodológicos. Domínios de Lingu@gem, Uberlândia, v. 10, n. 3, p. 1019–1045, 2016. DOI: 10.14393/DL23-v10n3a2016-13. Disponível em: https://seer.ufu.br/index.php/dominiosdelinguagem/article/view/33021.

PEREIRA, Márcia Helena de Melo. Tinha um gênero no meio do caminho. A relevância do gênero para a constituição do estilo em textos escolares. Dissertação (Doutorado em Linguística Aplicada). Instituto dos Estudos da Linguagem – Universidade Estadual de Campinas, São Paulo 2005.

PRADO, Anne Carolline Dias Rocha. Participação, negociação e escolhas: como acontece a escrita conjunta no processo de construção de uma resenha? 2019. 154f. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Vitória da Conquista, 2019.

PRADO, Anne Carolline Dias Rocha. A relação entre estilo e gênero na escrita individual e na escrita conjunta: estilos em intersecção. 2022. 281 f. Tese (Doutorado em Linguística). Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Vitória da Conquista, 2022.

PASSARELLI, Lílian Ghiuro. Ensino e correção na produção de textos escolares. São Paulo: Cortez, 2012.

POSSATI, Janaína Fernandes. A reescrita dialógica. 2013. 206f. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2013.

RUIZ, Eliana Donaio. Como corrigir redações na escola. 2 ed. São Paulo, Contexto, 2010.

SOARES, Magda. Alfabetização e letramento: caminhos e descaminhos. São Paulo: UNIVESP, 2004

VIEIRA, Francisco Eduardo; FARACO, Carlos Alberto. Escrever na universidade: texto e discurso. São Paulo: Parábola, 2019.

VOLÓCHINOV, Valentin. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. Tradução, notas e glossário de Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. 2. ed. São Paulo: Editora 34, 2018.

Downloads

Publicado

30-12-2023